quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Os Expostos da Roda de Góis

Das "voltas" que vamos dando pela Net, encontrei um trabalho de João Alves Simões, realizado em 1999, para a obtenção do grau de Mestre na Faculdade de Letras da Univ. do Porto, sobre os Expostos da Roda de Góis de 1784 a 1841.

Por achar o tema interessante e actual (infelizmente as crianças abandonadas são, ainda hoje, uma realidade) e porque, como irão verificar, tem uma ligação ao Tarrastal, vou procurar fazer um resumo da informação contida nesse documento.

A Ordem Circular de 24 de Maio de 1783 previa que em cada concelho existisse uma "Casa da Roda". Essas casas tinham por missão acolher as crianças aí abandonadas - os Expostos - e com a particularidade de não ser possível conhecer/identificar as pessoas que ai as abandonava.

Estas instituições visavam dar resposta á necessidade de aumentar a população e, através do suporte dado ás crianças abandonadas, evitar a sua morte. As crianças mantinham-se sob a protecção destas casas até aos 7 anos de idade. Considerava-se que com essa idade a criança já tinha condições trabalhar e ganhar o seu sustento.

A vila de Góis rapidamente deu resposta a esta circular pois o primeiro registo de um exposto é datado de 26/03/1784 com o nome de H. Benedito. O registo do último é de 26/05/1841. Ao todo, calcula-se que serão 507 os expostos da Roda de Góis.

De acordo com a tradição oral, a Roda funcionou em Góis numa casa que existe na rua que conserva esse nome - Rua da Roda - situando-se ao fundo, à direita.
A casa estaria, nessa época, fora da vila o que facilitava o processo - as pessoas podiam ir sem ser vistas, principalmente durante a noite, facilitado pela falta de iluminação nocturna.

A designação de "Roda" resulta do processo como eram recolhidas as crianças. Existia numa das paredes uma roda ou tambor giratório em que se exponham as crianças. Era tocada uma sineta a avisar da chegada dos expostos e a Ama Rodeira fazia então girar o tambor e recolhia a criança. Desta forma era salvaguardada a entidade de quem tinha entregue a criança. A Ama Rodeira deveria providenciar de imediato alimento e aconchego ao exposto.

Por regra, a estrutura de empregados de uma "Casa da Roda" era constituída por 1 Directora, a Ama Rodeira, uma Servente e as Amas de Leite necessárias.

As amas tanto poderiam ser internas como externas (ou de fora). É a estas últimas que são, após a prestação dos primeiros cuidados,  entregues as crianças expostas para serem criadas até aos 7 anos.

 As amas ficam obrigadas a providenciar comida, cama e roupa, ou seja, tratá-los como se fossem seus filhos e em troca recebem um vencimento pago pela Câmara.

Na Roda de Góis, a exemplo do que se verificava noutras instituições, identificaram-se casos em que  os expostos eram filhos das próprias amas. Desta forma, as mães procuravam obter um rendimento extra através do vencimento que auferiam como amas e proporcionar melhores condições de vida para toda a família. 

O vencimento foi variando ao longo dos anos, passando de um misto de dinheiro e géneros para apenas dinheiro. Por volta de 1820, o vencimento de uma ama era de 480 a 800 réis mensais para as "amas de seco" e 1.000 a 1,200 réis às amas de leite. O problema estava, normalmente, na demora no pagamento do vencimento que chegava a ter um atraso de 36 meses.

É no capítulo das amas que aparece o Tarrastal pois, de acordo com os dados disponíveis, existiu 1 ama nesta localidade. Está identificada com o nome Josefa Rodirgues, esposa de Aurélio Luis que terá tido a seu cuidado 3 expostos - Novembro de 1794, Dezembro de 1797 e em 1799.

As condições de vida e o nível de pobreza a que a maior parte da população estava sujeita encontra-se bem vincada no documento que inicialmente referi pelo que aconselho a sua consulta caso pretendam uma informação mais completa e detalhada. 

2 comentários:

Paula Santa Cruz disse...

Bom dia,
Já li o livro a que se refere, e achei-o muito interessante. No Cadafaz, como em outras aldeias do concelho de Góis, também existiram amas, algumas das crianças que eram criadas por elas não eram deixadas na Roda de Góis mas noutras Rodas. Em alguns casos as amas eram as próprias mães, que assim podiam alimentar os próprios filhos.
Neste momento estou a pesquisar a minha genealogia, em que um dos casos é de uma criança exposta na Roda em Coimbra e foi criada no concelho de Góis. Também descobrir que tenho antepassados que viveram no Tarrastal.
Cumprimentos
Paula Santa Cruz

Anónimo disse...

Bom trabalho de investigação!
Curiosidade:..Considerava-se que com 7 anos de idade uma criança já tinha condições para trabalhar e ganhar o seu sustento...
Como mudam os tempos. Agora com 18 anos considera-se que ainda se é muito "criança" para trabalhar ou ajudar os pais.. E estamos em crise, só se for crise de valores!
Um cadafazense que gosta do Tarrastal e lá tem grandes amigos!
Mais uma vez Bom Natal!